12/06/2006, Ag/Nativa Comunicações
Parintins AM- Ele desperta paixões e divide uma cidade. Mexe a cabeça, torce o rabo, dança e brinca com fanáticos torcedores. Endeusado e amado, o boi de pano é o principal personagem da festa folclórica que seduz multidões e se tornou atração nacional. Dentro de vinte dias, o boi brinquedo de São João vai reunir mais uma vez um enxame de turistas que prometem invadir literalmente as ruas de Parintins, repetindo a euforia que só acontece uma vez por ano.
É uma paixão que não tem limites, chega e arrebata. E não é só parintinense que se apaixona. Tem torcedor apaixonado em São Paulo, Rio de Janeiro, em Belém, no exterior, em Manaus então, nem se fala! Os manauaras chegam a se tornar mais doentes pelo boi que o próprio parintinense que já nasce com a marca registrada, ou seja, azul ou vermelho.
Criatura que aumenta a adrenalina e eleva à última potência a alegria do povo, o boi é pura emoção brotando de todos os poros. Não é à toda que todo o espetáculo, ele é de longe, o personagem mais assediado pelas câmeras e flashes. E quando entra na arena, sai da frente, o Bumbódromo é capaz de vir abaixo, no sentido da alegria, é claro.
Na etapa final dos trabalhos, os tripas - condutores do boi de pano - que hoje são responsáveis pela confecção do animal, finalizam as estruturas e os detalhes do sopro que vai dar vida para o boi evoluir.
Nos últimos anos, a leveza das estruturas tem possibilitado melhor performance na evolução. Mas nem sempre isso foi possível. Com a introdução de novos materiais na confecção das estruturas, a madeira, o cipó e a cabeça do animal, foram substituídos no processo de transformação. Nos primeiros festivais era utilizada a cabeça de boi de verdade, com chifres, ossada e uma pernamanca peça de madeira para segurar a estrutura. Hoje o boi é confeccionado em fibra de vidro, esponja especial, veludo lycra, isopor, e tintas especiais. Com as mudanças, o peso que antes chegava a 35 ou 40 quilos reduziu pela metade pesando atualmente de 15 a 18 quilos no máximo.
A energia, a amor devotado ao brinquedo, de forma direta e indireta chegam até eles, os tripas, o que aumenta a responsabilidade. E mais, é preciso ter sangue frio para suportar a carga de adrenalina. Emoções à parte, o Tripa do Caprichoso, Marquinhos Azevedo, 40, com 16 só de boi-bumbá, confirma que na hora H, dentro da arena, é preciso segurar qualquer sentimento emotivo, ser frio, botar o pé chão, ter um toque de audácia. A galera é quem vai extravasar a emoção, isso é que faz a diferença na apresentação, afirma. Longe da responsabilidade, a paixão é a mesma do mais fanático torcedor.
Pra falar desse amor, dessa paixão é difícil, não sei explicar, acho que o boi é mágico, está no sangue, o povo é contagiado porque passa por gerações, tenta explicar Marquinhos. Desde curumim, ele lembra que já corria atrás do Caprichoso na travessa Cordovil, nunca gostou de ser índio, queria mesmo correr atrás do boizinho. Jamais imaginei que um dia estaria debaixo dele, ainda mais nesta era que o boi ganhou dimensão nacional e até internacional, comenta.
No Garantido, a paixão flui na mesma intensidade. Para o Tripa Denildo José Matos Ribeiro, Piçanã, 33, a paixão que move o torcedor está na evolução do boi, nos movimentos que se aproximam do real. " O boi é carinhoso, dengoso, isso conquista e emociona. Pra mim todos ficam apaixonados quando ele está evoluindo, representando uma nação", diz Piçanã.
Evoluir na arena, dançar, mexer com a galera e ainda fazer movimentos que imitem um boi de verdade, não é tarefa fácil. Há doze anos, Piçanã, assumiu a responsabilidade pelo item no bumbá Garantido.
Assim como o Tripa do boi Caprichoso, ele também brinca desde criança e acalentava o sonho de se tornar item. Discípulo do artista Jair Mendes, autor do boi biônico da década de 70, o primeiro a fazer movimentos como mexer a cabeça, Piçanã trabalha de forma minuciosa na confecção do boi de pano sempre acompanhado pelo "mestre" como se refere a Jair. "Agora mesmo ele veio ver o meu trabalho e disse que está perfeito. São seis bois concluídos, dois para cada noite de apresentação", detalha.