Uma pesquisa referente a um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) de Jornalismo deu a um documentário de média duração uma ótica diferenciada sobre um dos principais componentes artísticos do folclore bumbá: a dança. Executado pelas jornalistas já graduadas Geisiane Macêdo Nunes e Priscila Daniela da Silva Peixoto, o trabalho foi orientado por Renan Albuquerque Rodrigues, professor-pesquisador da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e doutorando em Sociedade e Cultura na Amazônia pela mesma universidade e foi intitulado de “O lugar da coreografia no Boi-Bumbá Garantido: Aspectos Históricos e Mudanças no 'DOIS PRA LÁ, DOIS PRA CÁ'".
As filmagens foram feitas no período de março a junho de 2012, o mesmo que engloba os preparativos para o Festival Folclórico de Parintins, informou o professor orientador do trabalho. “Já de agosto a outubro de 2012 elas fizeram um relatório de pesquisa, que contém cerca de 50 páginas”, pontuou Renan. No trabalho, as manifestações rítmicas do boi Garantido foram a pauta da produção.
Cenários
Os lugares que serviram de cenário para o documentário, que tem a duração de 21 minutos, giram em torno do Curral do Garantido, e no escritório da presidência do bumbá, onde o presidente Telo Pinto foi entrevistado. Integrantes da Companhia de Dança Garantido Show e da Associação Folclórica Boi-bumbá Garantido, de Parintins - AM, também tiveram depoimentos coletados para o trabalho.
Todas as etapas do material audiovisual, tanto o processo que envolve a pesquisa quanto a disposição de infraestrutura para a execução do produto foram custeados por verbas emitidas pela própria UFAM e pelas duas acadêmicas. O objetivo do trabalho, de acordo com Renan, é fazer uma avaliação do conceito de dança folclórica dentro do contexto do Garantido, e descobrir qual é o lugar da dança no espetáculo bumbá.
“Uma das conclusões obtidas é que a dança folclórica que hoje se faz está ressignificada. Sempre há um debate sobre a questão de ter se perdido a tradição na dança folclórica bumbá. Acontece que não há uma perda de identidade, mas sim uma questão de ressignificação de saberes, no âmbito da antropologia cultural, que cerceou as pesquisas do trabalho”, afirmou Rodrigues.
Ressignificação, não a renegação de identidades culturais
Ainda de acordo com ele, o processo de ressignificação da dança folclórica bumbá é o que de fato vigora, e não a renegação de uma identidade cultural, pela leve mescla de elementos coreográficos-cênicos oriundos de outros estilos artísticos. “Tem um autor chamado José Guilherme Magnani, Doutor em Antropologia e professor da Universidade de São Paulo (USP). Ele é um dos autores brasileiros que melhor levam este conceito. E ele diz que a cultura não se perde por adquirir novos conhecimentos. Ela ressignifica a sua identidade. A dança, por mais que muitos ressaltem, afirmem e digam que ela perdeu sua identidade, na minha opinião ela se apenas se ressignifica. Considero o termo perda de identidade como um equívoco”, disse Renan.
A força das manifestações coreográficas nos espetáculos bumbás é elencada pelo doutorando como o que chama o público para acompanhar a festa folclórica. “Hoje nos currais muito do que acontece ocorre por conta das coreografias. A meu ver, a coreografia é o grande chamativo para que as pessoas conheçam os bumbás. Todas as toadas, se fossem centradas apenas no “dois pra lá e dois pra cá” seriam monótonas. A coreografia tem que passar por releituras ano após ano para que a festa dos bois continue esse sucesso”, ponderou o professor-pesquisador.
Dança como rito de afeto
Conforme Rodrigues, a dança é um rito de afeto e, inserida na questão evolutiva e antropológica, é utilizada para seduzir o outro. “As pessoas dançam não porque é bonito, e sim porque seduz. E por isso ela é componente do boi bumbá para incitar a alegria e a sexualidade”, completou, alegando que a cada vez que o ser humano conhece algo novo, o seu conjunto de saberes se renova, e se ancora novos conhecimentos.
“James Joyce, que compôs a obra “Ulisses”, aborda nela o work in progress (trabalho e progresso). Esse conceito nós utilizamos para tentar entender a dança, que por si só é um trabalho em progresso. O ser humano dança por necessidade”, finalizou Renan. O documentário foi publicado na revista RELEM - publicação semestral de caráter técnico-científico que reúne trabalhos inéditos relacionados à cultura, linguagem e espacialidade – e pode ser conferido aqui.